A sala do tribunal plenário, em Lisboa – Irene Pimentel

Irene Pimentel descreve nesta breve exposição a instrução do “processo” nos “tribunais plenários”. Recordamos que tal como o anterior, estes textos recordam a história da resistência ao fascismo português e assinalam a cerimónia do descerramento da lápide, no passado dia 6, na antecâmara da sala do Tribunal da Boa-Hora, em Lisboa. Aí decorriam as sessões desta “justiça pidesca”, praticada por “juízes” submetidos ao Estado Novo.

foto da cerimónia do Tribunal Plenário (web)
No passado 6 de Dezembro o Movimento resgatou esta sala da sua memória fascista

Aqui, nesta sala, decorreram, entre 1945 e 1974, as sessões do Tribunal Plenário, onde foram julgados inúmeros adversários e presos políticos da ditadura, acusados de «crimes» contra a segurança do Estado. Criados pelo diploma n.º 35 044, de 20 de Outubro de 1945, os tribunais plenários não actuavam com independência e, salvo excepções, limitaram-se a corroborar os autos de instrução da PIDE/DGS. Nos julgamentos políticos dos tribunais plenários, os juízes eram nomeados segundo critérios de estrita confiança política do regime.

Cobriam as ilegalidades e violências cometidas pela PIDE/DGS, na instrução dos processos, aceitavam como prova os autos de declarações preparados, por essa polícia, com recurso à tortura e intimidação. Nos julgamentos realizados nos tribunais plenários, entre 1945 e 1974, era a PIDE/DGS que determinava a acusação – e até a defesa – e muitos acórdãos judiciais reflectiram ipsis verbis os relatórios dos processos-crime, instruídos por esta polícia. Ou seja, antes de o Tribunal julgar, a PIDE/DGS já tinha determinado a sentença.

Nesta sala, entre 1945 e 1974, as testemunhas de acusação eram elementos da própria PIDE/DGS, que confirmavam as acusações e “testemunhavam” que os autos tinham decorrido, sem qualquer pressão ou coacção. Muitos juízes impediram os arguidos de explicarem como tinham sido extorquidas confissões e as torturas de que tinham sido alvo, e consentiram, sem reacção, agressões a presos políticos e seus advogados de Defesa, pela PIDE/DGS. Muitos destes advogados passaram, em plena audiência, de defensores a réus detidos.

Devido a denúncias dos métodos da PIDE/DGS e de defesa das suas opiniões, muitos presos políticos ouviram as suas sentenças, no calabouço do tribunal da Boa Hora, para onde tinham sido enviados, por ordem do juiz, empurrados por agentes da polícia, que, por vezes, os espancaram em plena sessão. Nesta sala, além de condenarem os adversários e presos políticos a pesadas penas, os juízes do Tribunal Plenário, sujeitavam-nos ainda a medidas de segurança, que prolongavam indefinidamente o tempo de prisão.
Em 14 de Maio de 1974, a lei Constitucional n.º3/74 extinguiu os tribunais plenários, iniciando-se, em Portugal o período democrático. Os tribunais deixaram de julgar os “crimes” contra a segurança do Estado e passaram a ser um órgão de soberania independente.

Irene Flunser Pimentel