Julgamento de João Almeida e Duran Clemente, Sentença é no dia 21 às 16h

O advogado José Galamba de Oliveira desfez a acusação que o Ministério Público urdira contra João Almeida e Duran Clemente e concluiu as suas alegações reclamando do juiz uma sentença exemplar, que condene o verdadeiro réu daquele processo, ou seja os autores da “falsa acusação”.

arguidos (web)

Terminou da melhor maneira a primeira audiência do julgamento em que são arguidos os dois membros do Movimento que no dia 5 de Outubro de 2005, na concentração fundadora do “Não Apaguem a Memória!”, foram apontados em auto de notícia por um subcomissário à paisana. O próprio representante do Ministério Público, perante o confuso testemunho do subcomissário António Quinto, foi obrigado a reconhecer que, in dúbio pro reu, por isso “não podia, em consciência, pedir a condenação”.

Não se conformou com essa interpretação a defesa, representada por Filomena Flores e José Galamba de Oliveira, que pegando nas palavras de diversas testemunhas que se pronunciaram pela situação absurda que estavam ali a presenciar, ao ver no banco dos réus dois cidadãos exemplares, acusados de coisa nenhuma e merecedores de louvor, destroçou literalmente a posição do Ministério Público.

Não se tratava de uma questão de in dúbio pro reu, explicou magistralmente José Galamba de Oliveira, que pôs em causa as intenções do sub-comissário Quinto, considerando que o zelo por ele demonstrado na situação criada em 5 de Outubro de 2005, na Rua António Maria Cardoso, em Lisboa, foi uma violação das suas obrigações de polícia e um relento de uma atitude autoritária serôdia e “pidesca”.

Contudo, o que mais o surpreendeu, disse, foi ver o Ministério Público embarcar numa acusação que põe em causa a própria Constituição da República Portuguesa, no seu capítulo mais nobre, o dos direitos, liberdades e garantias. Desmontou, peça por peça, a tese da acusação, ilustrando com a jurisprudência de reconhecidos mestres, entre eles Sérvulo Correia, que o decreto-lei que a sustentava data de Agosto de 1975, e correspondia a um período preciso da democracia, o do PREC (processo revolucionário em curso) e só por inércia do legislador não fora ainda abolido.

Com efeito, ao postular que as manifestações, concentrações, desfiles, cortejos, e por aí fora, tudo ao monte e sem distinção, só podiam realizar-se nos sábados à tarde e, nos dias úteis, só depois das 19h30, estava, como era patente, a reportar-se a um tempo em que se vivia a semana-inglesa, e a emergência de partidos reaccionários de direita e direita fascista punha em risco a sustentação do regime saído do 25 de Abril de 1974. Daí a redacção atabalhoada, onde num artigo se menciona a imperatividade de “obter” autorização, mas no arrazoado legal subsequente não se especifica para quê, deduzindo-se por absurdo, que nela podem caber todas os ajuntamentos ou reuniões de mais de três pessoas na via pública.

A Constituição de 1976, que nesse aspecto nunca foi revista, determina o direito de reunião e expressão pública de opinião. Quando muito, admite-se, por uma questão de protecção dos manifestantes que civicamente exprimem a sua opinião sobre determinada matéria social, que a PSP e outras forças de segurança possam deslocar-se para o local da concentração – mas com aquela finalidade e não com intenção persecutória.

Foi precisamente esta a atitude do subcomissário Quinto, que, sublinhou José Galamba de Oliveira, na sua compreensão “pidesca” dos que são as liberdades cívicas, ignorou inclusive um relatório de um seu colega, que passara pela via em questão às 14h30 e detectara aí uma aglomeração, mas que não trazia qualquer perturbação pública, pelo que se limitara a registar precisamente isso e prosseguira a ronda. Pois o subcomissário, menos de meia-hora passada, detectou uma perigosa manifestação com corte da via pública e intenções agressivas para com a propriedade privada – certamente o monte de ruínas que foi a sede da antiga PIDE/DGS e onde se quer construir um condomínio de luxo.

Ficou claro para todos os que escutaram as alegações da defesa que comunicar a realização de uma concentração junto do Governo Civil, com 48 horas de antecedência, “para segurança dos manifestantes”, enfatizou José Galamba de Oliveira, só é necessário se houver a certeza de que ela se realizará. Mas se for meramente uma mensagem que passa de boca em boca, de telemóvel para telemóvel, sem qualquer compromisso de quem recebe nem de quem envia, quem, em consciência pode ou deve fazer essa comunicação?

De tudo isto deduziu a defesa de Duran Clemente e João Almeida que a acusação do Ministério Pública era uma grosseira ofensa ao Estado de direito, pelo que se impunha não uma sentença baseada na presunção de uma dúvida, mas na condenação firme e serena dos acusadores, por manifesta má-fé.

Ouvidas as alegações o juiz do 6º Juízo Criminal marcou a leitura da sentença para o próximo dia 21, pelas 16h, na mesma sala de audiências, ao antigo Tribunal da Polícia, junto ao Palácio da Justiça, na Av. Marquês da Fronteira, em Lisboa.