Fernando Vicente relata na SIC as torturas a que foi submetido pela PIDE/DGS

NOTA: Podem ir logo para a entrevista a FV com início nos minutos 20 regulando o cursor que se mostra na parte inferior do video quando se tem sobre ele o cursor e está em marcha.

Fernando Vicente é um dos fundadores do Movimento Não Apaguem a Memória, em 5 de Outubro de 2005 e foi até 2008 um dos seus membros mais activos.
Fernando Vicente participou no dia 1 de Março de 2011, no programa da SIC Histórias com gente dentro, relatando as torturas a que foi submetido pela PIDE, quando foi preso, em 10 de Novembro de 1970. Foi o preso político que a mais tempo de tortura do sono foi submetido pela PIDE/DGS, 31 dias e noites em 33 dias, em três períodos consecutivos de 5, 13 e 13 dias e noites sem dormir. Neste vídeo Fernando Vicente revela-nos o horror da tortura do sono e da estátua e de como é possível suportar até ao insuportável tais torturas para não entregar outros companheiros à polícia e aos mesmos sofrimentos, para não prejudicar a luta contra a ditadura fascista a que se entregara.
O vídeo que aqui se apresenta foi obtido do site da SIC online correspondente àquele programa.
Fernando Filipe Esteves Vicente nasceu em 12.Junho de 1941, é casado e tem duas filhas. Foi dirigente estudantil de 1962 a 1967, no Instituto Superior Técnico, onde completou o curso de engenheiro civil neste último ano. Durante o serviço militar obrigatório esteve na guerra colonial, de 1968 a 1971. Em 10 de Novembro de 1972 foi preso pela PIDE que o acusava de pertencer ao PCP. Foi submetido a tortura de 14 de Novembro a 17 de Dezembro de 1972.
Foi militante do PCP de 1962 a 2009, foi um dos quadros mais responsáveis pela realização da Festa do Avante, de 1977 a 2004 e foi membro do Comité Central deste partido de 1975 a 2004.

Cruzada contra o apagamento da memória é o título do Publico

Público

9 de Novembro de 2008

 

 

 

 

Em Setembro passado, quando foi anunciado que a Câmara Municipal de Peniche e a Enatur tinham retomado as conversações para a construção de uma pousada no velho forte de Peniche irrompeu uma polémica que se arrasta até hoje.

 

No centro do debate que envolve historiadores, resistentes antifascistas, o Partido Comunista Português (PCP) e a autarquia penichense, está a associação, num espaço que foi prisão de presos políticos durante o Estado Novo, de uma unidade hoteleira e do Museu da Resistência. As divergências, que se estenderam para a imprensa e para a blogosfera, resultaram num combate retórico: de um lado, estão a autarquia, o PCP e a União de Resistentes Antifascistas Portugueses (URAP); e do outro, está sobretudo o movimento cívico Não Apaguem a Memória (NAM).— Os primeiros argumentam que é possível conciliar a vertente turística com o espaço museológico ali já existente (que deverá ser ampliado e melhorado, defendem); enquanto o NAM fala em incompatibilidade, desvalorização do museu e risco de perda da memória museológica do fascismo português.

 

Depois da transformação da antiga sede da PIDE em Lisboa, na rua António Maria Cardoso, num condomínio de luxo, e do anunciado projecto de converter o Tribunal da Boa Hora (antigo tribunal plenário) num hotel de charme, a direcção do NAM não quer perder mais combates e está determinada em lutar para que o Museu da Resistência (numa versão aperfeiçoada e aumentada) seja “o centro das atenções” da Fortaleza de Peniche. “E importante dar a conhecer o que foi a luta pela liberdade durante o Estado Novo”, afirma Raimundo Narciso, presidente do NAM.

 

Num artigo de opinião datado de 11 de Maio de 2006, publicado no PUBLICO, Pacheco Pereira foi um pouco mais longe do que o NAM. Defendeu que o Museu da Resistência deveria ser dotado de uma “dimensão” que extravasasse a “memória prisional”, propondo que o espaço fosse também um “repositório museológico mais vasto do meio século do Estado Novo”. “A resistência não se percebe sem se perceber o regime”, argumentava o historiador. “Está na altura de congregar tudo isso numa instituição própria que preserve a memória, permita a história e favoreça a investigação, sem apagar a recordação dos tempos negros da ditadura. Não se trata de relativizar a história, mas de começar o caminho para tomar o século XX compreensível para as novas gerações que nunca o verão com a dimensão ética e sentimental dos que foram seus protagonistas.”

 

Também o historiador João Madeira considera que o país tem condições para “resgatar” a memória da história da ditadura sob uma “perspectiva séria e rigorosa”. Contudo, embora esteja “ao lado” daqueles que se opõem à construção da pousada no Forte de Peniche, o co-autor de Vítimas de Salazar. EstadoNovo e violência política (2007) não é apoiante da ideia “imobilista e tradicional” de um museu da ditadura. “No país há locais susceptíveis de constituir uma rede da memória, com lugares e percursos. A preservação da memória deve ter um sentido dinâmico e uma abrangência social”, diz, acrescentando que a criação de um roteiro deve ir além das dimensões monumentais e documentais,

 

 

Um museu no Aljube?

 

Apesar de as divergências em torno do Forte de Peniche continuarem a ecoar em vários meios, o projecto de construção da pousada não tem tido desenvolvimentos. Ao P2, o presidente da câmara, António José Correia, disse aguardar um encontro com o Conselho de Administração da Enatur para o estabelecimento de “um plano de trabalhos com vista à concretização” da instalação da unidade hoteleira. E fez notar que “neste momento não há nenhum projecto em elaboração”. Quanto às críticas de que a autarquia tem sido alvo, especialmente por parte do NAM, António José Correia reiterou que “a preservação da memória deverá ficar salvaguardada na elaboração do projecto” e sublinhou que já recebeu essa mesma “garantia” por parte da direcção do Turismo de Portugal.

 

A par desta polémica sobre o Forte de Peniche, o NAM — prossegue a sua cruzada contra o “apagamento” de alguns dos símbolos do regime autoritário. Protestou veementemente contra a construção do condomínio Paço do Duque, na rua António Maria Cardoso, e já augurando um destino diferente para o Tribunal da Boa Hora, descerrou uma lápide evocativa da “justiça” do tribunal plenário que ali funcionou entre 1945 e 1974. “Os governos portugueses não foram — sensibilizados para uma politica de preservação da memória”, nota Raimundo Narciso. O mesmo não aconteceu em Cabo Verde, onde a antiga Colónia Penal do Tarrafal, criada pelo Governo de Salazar em 1936, foi declarada Monumento Nacional em 2006.

 

Mas o movimento cívico que mais tem pugnado pela protecção dos lugares associados à memória da repressão não quer que a sua acção se limite a placas e memoriais. Há vários projectos na calha: a criação de espaços museológicos na antiga sede da PIDE no Porto, actual Museu Militar, e no Aljube (que acolhe valências do Ministério da justiça).

 

Raimundo Narciso diz que o NAM tem estado em conversações com o ministério da Justiça e a Câmara de Lisboa para converter a cadeia do Aljube em museu da resistência e da liberdade. O primeiro passo para a realização deste museu será a realização de uma exposição na antiga cadeia política em 2010 no âmbito das comemorações do centenário da República.

 

“Há que tirar os cadáveres do Armário”

Margarida Marante
entrevista Raimundo Narciso para o semanário Sol
(2008-11-08)

SE BEM ME LEMBRO

UM colóquio sobre o Tarrafal para contar urna história triste sobre o nosso passado ou avivar a memória dos mais esquecidos… Por de trás, um nome curioso: ‘Não Apaguem A Memória, um Movimento presidido por Raimundo Narciso quadro importante do PCP na clandestinidade e que, entretanto, saiu em dissidência. É a segunda vez que me encontro com ele para o entrevistar. Personalidade for te, rigoroso e emotivamente controlado, qualidades que muitos anos vividos na clandestinidade terão influenciado. Hoje vive entu­siasmado com a receptividade às suas ideias por parte do país ins titucional, seja no apoio ao colóquio que decorreu no passado fim-de-semana no Parlamento, seja na possível promoção do dia da memória dos resistentes e das vítimas da ditadura, ou ainda da transformação da cadeia do Aljube em museu ou da alteração dos manuais de História Tarefas imensas, não fosse também imensa a perseverança do meu convidado.

Como surgiu a ideia de fazer um colóquio sobre o Tarrafal?

Enquadra-se no objecto do Mo vimento Cívico ‘Não Apaguem a Memória’ (NAM), centrado na preservação da memória da luta de quase meio século contra a di tadura e o colonialismo. O cam po de concentração do Tarrafal é paradigmático, simbólico des sa luta.

É a primeira intervenção pública so bre o Tarrafal sem que a iniciativa seja do PCP?

É provável Tivemos o cuidado de convidar para assistir a União de Resistentes Antifascistas Portu gueses (URAP), uma organização do PCP, que não respondeu ao apelo. É pena, porque no Tarrafal houve uma presença maiori do campo.

É vosso propósito transformar o dia 29 de Outubro numa efeméride?

A sugestão partiu de um dos membros da associação, Ed campo de concentração do Tarrafal po deria ser um dia para assinalar a memória dos resistentes.

A ideia vai ter receptividade?

Acho que é boa, mas não quere mos impor a nossa vontade. A sua concretização deve resultar de um consenso alargado.

Nunca estere preso no Tarrafal?

Nem no Tarrafal, nem noutra prisão.

Mas tem consciência que era um campo muito duro.

Extremamente penoso. Suponho mesmo que as suas condições fo pessoas morressem. Mor reram 32 pessoas, muitas ainda muito novas: 10 tinham menos de 30 anos. Aliás, os presos do grupo da revolta dos marinhei ros, dos anos 30, tinham 18 ou 20 anos. Mas o mais novo prisioneiro foi Ed mundo Pedro. Tinha 17 anos.
As condições eram extremamente más, os presos morriam de doenças, além de serem submetidas a um tra balho muito duro e por vezes à tortura da ‘frigideira’: eram co temperaturas muito elevadas. O ambiente também molestava do ponto de vista psi cológico e moral. Todas as difi­culdades e humilhações a que os presos eram submetidos criavam um ambiente horrendo.

Se não forem iniciativas como esta o Tarrafal apaga-se da memória ou nem chega a entrar, no caso dos mais novos ?

Exactamente. Propomos fazer eventos educativos como este co lóquio, que envolveu o apoio do Presidente da Assembleia da Re pública e dos ministros da Justi ça e da Cultura. Um dos objecti vos centrais é que o Estado, e não apenas nós ou qualquer organização pri vada, assuma a responsabilidade de preservar a memória desse pe­ríodo e dos seus locais mais sim bólicos. O NAM nasceu de um grupo que se indignou pela trans formação da sede da PIDE/DGS num condomínio privado; pre tendíamos que no local houvesse algo que simbolizasse o que ali se passou durante tantos anos. Outra das metas é a transformação da ca deia do Aljube num museu da re sistência e da Liberdade.

Têm apoios para Isso?

Não temos, incitamos a que o Es tado promova e aceite o projecto. E a ideia foi bem recebida, aguar damos agora que levem a bom termo a nossa pretensão.

Os portugueses estão receptivos a descobrir esse período da História?

Acho que os jovens, que não viveram esse período, estão receptivos. É uma atribuição do Estado facultar esse conhecimento às novas ge rações. Conhecimento que — como sucedeu com a Revolução Republicana de 1910, que foi de certo modo apagada pelo regime que se seguiu é muito pou co facultado nas escolas.
Outro dos objec tivos é promover um roteiro na cional que ofereça um mapa dos locais com uma descrição histó­rica dos acontecimentos. E tam bém estamos empenhados na criação de instrumentos didácti cos que possam ser utilizados nos currículos escolares. Não de pende de nós, mas é um serviço que pretendemos prestar porque vemos que na generalidade as pessoas não sabem nada do que se passou.

Associação quer memorial às vítimas da PIDE

Local escolhido é um muro em frente à antiga sede da polícia política

A associação cívica «Não Apaguem a Memória» (NAM) quer fazer um memorial, com artistas portugueses, às vítimas do fascismo e da repressão da PIDE num muro em frente à antiga sede da polícia política, em Lisboa. 

O projecto foi revelado por Raimundo Narciso, da direcção da associação, no final de uma audiência, esta manhã, com o presidente da Assembleia da República, Jaime Gama. 

Esse memorial ficaria num muro situado na Rua António Maria Cardoso, junto ao edifício onde funcionou a sede da PIDE/DGS, e que fica numa propriedade do Marquês de Pombal. 

Em declarações à Agência Lusa, Raimundo Narciso, presidente da NAM, afirmou que já foram feitos contactos com o dono da propriedade e com a Câmara Municipal de Lisboa para ser criado esse memorial. 

O projecto passa por convidar artistas portugueses para fazer esse memorial «não só de evocação das vítimas da PIDE, mas também dos defensores da liberdade e de evocação do 25 de Abril» de 1974. 

Para esta iniciativa, além dos proprietários e da câmara lisboeta, a associação «Não Apaguem a Memória» pretende ter o apoio de «organizações com interesse na memória» desses anos, como a Fundação Humberto Delgado ou a Fundação Mário Soares ou a União dos Resistentes Antifascistas Portugueses (URAP). 

Outros dos projectos são a criação de um museu da resistência e liberdade na antiga cadeia do Aljube, além de um núcleo museológico no local da antiga sede da polícia, transformado em condomínio privado

notícia da Lusa