Justino Pinto de Andrade


[Extracto de depoimento, retirado de vídeo – no colóquio promovido pelo NAM, Tarrafal uma prisão dois continentes, em 29 de Outubro de 2008, na Assembleia da República – do ex-prisioneiro do campo de concentração do Tarrafal, Justino Lopes da Costa, hoje professor universitário em Luanda.]

“Em 1970 o Manuel dos Santos Júnior foi um dos precursores da nossa luta moderna [ex-preso do Tarrafal a viver em Lisboa com o apoio da Misericórdia. Convidado pelo NAM acabou por não participar no colóquio. Deu então uma entrevista ao Expresso]. Era um dos mais novos. Era membro do PCA. Ser apenas nacionalista era fácil, ter uma ideologia era mais consistente. É pena não ter vindo ao colóquio.


Intervenção do Justino Pinto de Andrade no Colóquio do Tarrafal na TV do NAM

… A nossa libertação [do campo de concentração do Tarrafal ] dá-se a 1 de Maio de 1974. Nos dias anteriores os guardas tinham sorrisos mal disfarçados, um comportamento diferente. Tinha acontecido alguma coisa…! Em 30 de Abril o director da prisão começou a dizer que compreendia a nossa luta embora não concordasse com a ideologia. “eu sou cristão e vocês são todos comunistas”. Eu sou democrata-cristão! Ora até ali sempre se mostrara adepto do regime e do colonialismo! Que coisa estranha.

…No dia 1 de Maio tudo se esclareceu, ouvíamos vozes ao longe, barulho e depois para nossa estupefacção parecia ouvirmos viva o PAIGC, viva o MPLA, viva a FRELIMO. Estou a sonhar ou estou a ouvir? Viva Amílcar Cabral, viva Cabo Verde, abaixo o colonialismo, morte ao fascismo. Concluímos que o quer que fosse nos era favorável.

Quando abriam os portões era para uma ou duas pessoas e para nos mostrarem “vejam , vejam como estão bons. São bem tratados.” Mostravam-nos como se mostra gado. Agora entraram vários oficiais e soldados com o director do Campo. Este ainda tentou minimizar a coisa. Que o Marechal Spínola tinha substituído Marcelo Caetano no Governo… mas depois os militares explicaram tudo e algum tempo depois libertaram-nos.

…Quando cheguei a Luanda uns dias depois fui de novo preso. O 25 de Abril ainda não tinha chegado a Angola. Mas uns dias depois todos os presos políticos libertados.”

nota: Os vídeos do Colóquio vão sendo actualizados com os depoimentos na íntegra. Iniciámos esta publicação pela intervenção do Justino Pinto de Andrade

Constantino Lopes da Costa

“…Não havia para nós nem água da torneira para beber. Manhã muito cedo chegava uma carreta de bois com água e enchíamos um tambor. Um tambor desses de gasolina de 100 ou 200 litros, para 24 horas. E éramos 100 presos. E nada mais.

Até às 11 horas a água ficava vermelha da ferrugem. E tínhamos de a beber… Em poucos meses veio a bênção. Todos os presos com uma inflamação horrível da pele que não podíamos vestir nem uma camisa…

Mas também pensávamos naqueles que por lá passaram antes de nós[os presos portugueses]. Se agora em 1962 era assim como não teriam sido tratados os que passaram por cá em 1936… Assim pensávamos.


Intervenção do Constantino Lopes da Costa no Colóquio do Tarrafal na TV do NAM

Não ficámos com ódio por ninguém. Nós estávamos politizados. Estávamos a lutar por uma causa. Não havia que ficar com ódio por ninguém. Éramos adversários numa luta.”

[Extracto da intervenção – no colóquio promovido pelo NAM, Tarrafal uma prisão dois continentes, em 29 de Outubro de 2008, na Assembleia da República – do ex-prisioneiro guineense do Campo de Concentração do Tarrafal, Constantino Lopes da Costa, hoje embaixador da Guiné em Lisboa.]

nota: Os vídeos do Colóquio vão sendo actualizados com os depoimentos na íntegra.