Associação quer memorial às vítimas da PIDE

Local escolhido é um muro em frente à antiga sede da polícia política

A associação cívica «Não Apaguem a Memória» (NAM) quer fazer um memorial, com artistas portugueses, às vítimas do fascismo e da repressão da PIDE num muro em frente à antiga sede da polícia política, em Lisboa. 

O projecto foi revelado por Raimundo Narciso, da direcção da associação, no final de uma audiência, esta manhã, com o presidente da Assembleia da República, Jaime Gama. 

Esse memorial ficaria num muro situado na Rua António Maria Cardoso, junto ao edifício onde funcionou a sede da PIDE/DGS, e que fica numa propriedade do Marquês de Pombal. 

Em declarações à Agência Lusa, Raimundo Narciso, presidente da NAM, afirmou que já foram feitos contactos com o dono da propriedade e com a Câmara Municipal de Lisboa para ser criado esse memorial. 

O projecto passa por convidar artistas portugueses para fazer esse memorial «não só de evocação das vítimas da PIDE, mas também dos defensores da liberdade e de evocação do 25 de Abril» de 1974. 

Para esta iniciativa, além dos proprietários e da câmara lisboeta, a associação «Não Apaguem a Memória» pretende ter o apoio de «organizações com interesse na memória» desses anos, como a Fundação Humberto Delgado ou a Fundação Mário Soares ou a União dos Resistentes Antifascistas Portugueses (URAP). 

Outros dos projectos são a criação de um museu da resistência e liberdade na antiga cadeia do Aljube, além de um núcleo museológico no local da antiga sede da polícia, transformado em condomínio privado

notícia da Lusa

 

50 anos da carta de D. António Ferreira Gomes a Salazar evocados domingo em COIMBRA

Cidadãos de Coimbra evocam domingo a carta a Salazar que o bispo do Porto D. António Ferreira Gomes escreveu há 50 anos, demonstrando que uma parte da Igreja Católica estava contra a ditadura 

O historiador Amadeu Carvalho Homem, que participa na homenagem ao prelado que desafiou António Salazar, disse hoje à agência Lusa que o ditador «não foi capaz de contestar os aspectos fundamentais da carta».

«Uma certa Igreja estava em profunda discrepância com o regime», sublinhou, lembrando que «Salazar teve sempre a preocupação de se apresentar como muito próximo das estruturas» da Igreja de Roma, chefiada em Portugal pelo seu amigo cardeal António Cerejeira.

Além de Carvalho Homem, catedrático da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra (UC), intervêm na sessão evocativa José Manuel Pureza, professor da Faculdade de Economia da UC, e José Dias, membro do movimento cívico Não Apaguem a Memória e principal promotor do programa.

«A carta do bispo do Porto produziu o efeito de uma bomba», por revelar que, ao contrário da ideia que Salazar tentava fazer passar, «havia em Portugal, afinal, duas igrejas», uma tradicional e conservadora – «mais ou menos cúmplice de tudo o que o Estado Novo fazia» – e outra progressista, que tinha críticas a fazer-lhe.

Frisando que D. António Ferreira Gomes, condenado ao exílio por ter posto em causa a ditadura, «era um dos grandes intelectuais portugueses do seu tempo», Carvalho Homem disse que a carta a Salazar veio «acrescentar uma dimensão política» à sua acção enquanto pastor da Igreja.

Em declarações à Lusa, José Manuel Pureza disse que a carta do bispo do Porto «em bom rigor não era uma carta», mas antes «um documento preparatório de uma reunião» que D. António teria com Salazar.

Foi escrito a 13 de Julho de 1958, no rescaldo das eleições presidenciais, ganhas pelo candidato do regime, Américo Thomaz, um desfecho contestado pela oposição, que apoiava Humberto Delgado.

Na carta, o prelado afirmava «que o comunismo pode coincidir com certas incidências concretas da sociologia cristã, que lhe é anterior, sem que por isso haja razão ou vantagem em falar de filocomunismo ou criptocomunismo para lançar a divisão entre cristãos».

O bispo do Porto dirigia-se a um ditador que não conhecia o estrangeiro e que nunca visitou os territórios de além-mar que constituíam o império «do Minho a Timor».

«Apesar do meu feitio sedentário, não tenho nos últimos anos recusado as oportunidades que se me oferecem de viajar pela Europa (…). Não poderei dizer quanto me aflige o já hoje exclusivo privilégio português do mendigo, do pé-descalço, do maltrapilho», lamentava.
Para José Pureza, a carta a Salazar é «um gesto de muita coragem» e traduz «uma reflexão crítica vinda da Igreja, considerada um dos pilares do regime».

O docente universitário salientou que o documento de D. António questiona «aspectos centrais» do Estado Novo, como o corporativismo e a relação do capital com o trabalho, bem como «a autonomia, ou não, dos católicos face ao regime».

Na sua opinião, o prelado veio afirmar também «o primado da consciência», demonstrando «que o pluralismo das escolhas é um bem ao serviço da mensagem cristã».

«A carta tem ainda um juízo crítico muito actual, que é o do primado das finanças públicas sobre as pessoas», disse, para recordar que «a grande obsessão de Salazar pelo equilíbrio das contas públicas é um velho mote da política portuguesa».

A homenagem a D. António Ferreira Gomes, em Coimbra, visa «não descuidar a memória daqueles que se revêem na atitude que tomou há 50 anos», segundo José Dias.

«Foi a primeira vez que um destacado membro da Igreja questionou o corporativismo, apelando ao sindicalismo livre e defendendo o direito à greve», enfatizou o organizador.

A sessão realiza-se domingo, às 11h00, junto ao monumento ao 25 de Abril, defronte do edifício onde funcionou a PIDE, a polícia política da ditadura. 

Lusa / SOL 

 

Caminhos da Memória (blog)

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Caminhos da Memória é um blogue que pretende dar voz a formas de lembrar, de evocar e de interpretar o passado, recorrendo a leituras contemporâneas da história e da memória.

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